o tempo
é matéria
estranha.
Se recortarmos os momentos, separarmos cada pedaço de lembrança como cena, se perde tudo aquilo que é de mais forte: o caminho, prospecção, consequência. Só o momento não dá conta. Dar seguimento baseado somente no que já passou deixa tudo sem gosto, sem sal. Pensar somente no que virá é, também, esquecer de onde se está vindo.
Mesmo com essa coisa esquisita gravitando toda partícula, Aurata parece, a cada novo passo, brincar sobre ela. A obra de Ramon Gonçalves sob o projeto não carece de tempo porque é viva. Não fica empoeirada em seus sapatos, esperando novas dores.
Já são alguns capítulos os que Gonçalves retoma seus antigos trabalhos para remodelá-los em um novíssimo corpo, vestido das novidades de sua cabeça. Grande parte dessa força vem da sua vastidão de obras e shows realizados ao longo desses 10 anos, das pessoas e discos que conheceu, e de cada pessoa que se tornou nesses tempos.
Seja por seu gênio criativo inquieto, pela enxurrada de ideias que aparecem, ou pela saúde de fazer, quanto mais Aurata se aproxima de uma maturidade serena, mais Gonçalves a elastece, como se a cada realização sua obra se tornasse menos objeto e mais pensamento.
Nas vésperas de apresentar o fim de um ciclo que durou seus primeiro 10 anos de vida, Aurata introduz uma nova perspectiva sobre seus sons. É como se para encenar um novo pedaço de lembrança, Ramon passeasse, brevemente, por diversos cantos de seu enredo.
Por isso, encontrar a obra de Aurata é andar com as pernas do tempo, por entre suas brechas, e construir uma passagem própria, que só você por sua senda conhecerá. A de Ramon está exposta aqui.
Pedro “Candioco” Antunes de Paula